Análise: Mario Strikers Charged

Eu normalmente começaria o texto com um “eu sempre gostei de futebol”, mas seria uma mentira. Já tive meu período de negação no esporte. Quando eu era moleque, com uns 9, 10 anos, não gostava muito. Primeiro porque, nessa idade, o futebol se resumia a ser fominha, já que a molecada odeia passar a bola. Segundo porque, como eu nunca tinha feito escolinha ou coisa parecida, era uma negação com os pés. Sou até hoje, aliás. Aí, mesmo quando eu tentava aprender a jogar, o primeiro ponto apresentado não me permitia, já que a molecada não tem noção de coletividade no jogo.

A parada mudou quando eu estava com uns amigos na quinta ou sexta série. Eu estava conversando com eles, os acompanhando durante o recreio, quando eles comentaram que iam jogar bola. Aí perguntaram se eu jogaria e, no embalo, falei que tudo bem. Logo já me jogaram para o gol porque ninguém queria jogar lá. A questão é que eu fui bem nesse primeiro jogo (vitória de 2 a 0). Meio desengonçado ainda, mas fui bem. A partir daí, aprendi a jogar pra valer de goleiro e comecei a gostar de verdade de futebol.

E isso passou a envolver jogos de videogame. O primeiro mesmo que eu me arrisquei a jogar foi uma versão piratona para PC do jogo da Eurocopa 2004. Arranjei um FIFA 98 ou 99 para jogar no Nintendo 64 e também comprei uma versão piratona do FIFA 07 no computador. Desde então, sou jogador assíduo dessas franquias anuais de futebol. FIFA, especificamente, nunca fui muito chegado ao PES. Eu geralmente gasto centenas de horas por versão jogando. Acredito que a minha favorita seja o FIFA 09 do Wii, mais porque, além do jogo normal, essa versão tinha um modo especial só para os Miis jogarem e que tinham até Power Ups.

O Mario Strikers Charged, já, foi o primeiro jogo de Wii que cheguei a comprar (junto do Twilight Princess e Mario Party 8). Piratão, óbvio, mas foi o primeiro que não era o Wii Sports. Joguei horrores, horrores. A questão é que eu nunca tinha terminado o modo campanha naquela época de jogatinas de cinco horas por dia durante as tardes do meu ensino médio. O tempo passou, meu Wii foi sendo cada vez menos jogado porque os jogos acabaram – sério, eu extraí até a nata do aparelho, joguei pelo menos um pouco de tudo que realmente era válido de se jogar nele, exceto por Xenoblade –, quando apeguei-me ao Xbocão e ao FIFA mecânico e repetitivo, porque a EA faz a patifaria de lançar o mesmo jogo todo ano com alterações mínimas de física que, na real, ninguém nota. Em seguida comprei meu Wii U e agora é meu aparelho favorito.

Eu tenho mania de, quando passeio no shopping, ver o preço dos jogos de Wii, acreditando que, como esses jogos são praticamente encalhe, existiria a possibilidade do preço ter caído de forma considerável. Inacreditavelmente, isso aconteceu com o Strikers Charged, de R$79,90 a R$29,90. Não pensei duas vezes. Acabei abatendo um crédito de quinze reais que tinha com a loja e o título saiu praticamente pelo preço de um jogo piratão. Isso foi há pouco mais de um ano.

A questão é que o meu eu jogador é muito mais maduro do meu eu de seis, sete anos atrás. E agora eu tenho noção de como se joga, como analisar o comportamento da inteligência artificial do jogo e assim vai. Cismei que iria terminar essa merda.

Não, não demorei um ano para terminar o jogo (que foi quando eu comprei). Naquela época, joguei umas três vezes, só, e nunca mais toquei. Só fui jogá-lo de novo recentemente porque a fonte do meu Xbox queimou e eu precisava de um jogo de futebol para passar o tempo.

Sabe um jogo filho da puta? Então, Strikers Charged é nessa pegada. No modo campanha, há três copas principais alternadas por uma espécie de “defesa do cinturão”. São chefes que, depois de ganhar o campeonato, o jogador tem que enfrentar em partidas numa série de melhor de três. No caso, os três chefes são Bowser Jr., Diddy Kong e Petey Piranha. Por que o jogo é filho da puta? Porque as duas primeiras copas são um passeio. Todo jogo é um 7 x 1 diferente para o seu time. Na terceira copa é quando o caldo engrossa. Digo, a IA começa a ficar sacana. A curva de dificuldade é de chutar o balde. Não estou com mimimi, sobre o jogo ser difícil, é que a discrepância das copas anteriores é muito forte. Como se não bastasse, a situação só piora no mata-mata. O jogador pode se classificar em primeiro, mas as chances de ser eliminado logo nas quartas de final são bem altas. Várias vezes fiz uma campanha perfeita para ser eliminado logo na semifinal. Rolou até uma identificação com o Corinthians mítico do primeiro semestre de 2015 na fase de grupos da Libertadores e no Paulistão desse ano. Paulistão, principalmente, porque eu era eliminado já na morte súbita, que é quando a partida empata e quem fizer o primeiro gol depois do fim do tempo regulamentar ganha.

Certo. Aí eu consegui ganhar na final e aliviei antes do Petey Piranha. Digo isso porque quando perdia para o Diddy Kong e para o Bowser Jr, eu não precisava passar por todo o campeonato de novo. Eu só precisava repetir a série contra o Diddy e contra o Bowser Jr.. E é o que eu esperava do Petey Piranha, por isso que aliviei. Até que me deparo com a tela do começo do terceiro campeonato, tendo que passar de novo por todas as partidas até a final.

Eu não tenho objeções ao Diddy Kong e ao Bowser Jr.. O Petey, no entanto, é uma bosta porque, se por algum acaso começa a perder a partida, o simples ato do carinha pegar a bola já é gol. Por isso, precisei recorrer a uns truques meio sujos para vencer. Marcar o primeiro gol e ficar recuando a bola para o goleiro, que não é alvo nem de itens, nem de pancadas. Tive que enfrentar o Petey umas três ou quatro vezes até vencer na terceira partida durante o Sudden Death.

Além do Road to Striker Cup, que é o modo campanha, há também o modo com desafios pré-estabelecidos pelo jogo, sendo um para cada personagem, que vão desde “não tome nenhum gol” a “marque sete gols na partida” (PASSEIO NO MINEIRÃO). Esses desafios, quando superados, liberam modificadores no Domination Mode, o modo de partidas simples (Kick-Off, nos jogos normais de futebol), como “todo chute é especial” e coisa do tipo.

Com relação ao gameplay, afirmo que, apesar de ter seus defeitos, ainda funciona muito bem até hoje. Ele não envelheceu. Com a bola nos pés, o botão A passa a bola, o B chuta e o direcional digital aplica uma espécie de drible, uma habilidade especial, para escapar do oponente que chega com tudo. Sem a bola, os comandos que interessam são o de carrinho, feito com o direcional digital, e o empurrão, ao chacoalhar o controle. O analógico serve para mover o personagem em ambas as situações. O botão Z é utilizado para levantar a bola. Quando usado junto do botão de passe, ele faz um lançamento por cima, abrindo para jogadas aéreas. Combinado com o botão de chute, ele encobre o goleiro.

Além disso, os capitães e os sidekicks podem desferir chutes especiais. No caso dos sidekicks, cada um tem seu chute especial – skillshot. Os capitães, especificamente, começam a carregar o chamado Mega Strike, bombas poderosas que podem render de três a seis gols. É válido lembrar que a velocidade varia. Se tentar o de seis gols, é mais difícil regular o chute para que ele seja mais rápido e, consequentemente, é mais fácil do goleiro defendê-lo.  Quando é o oponente que desfere um Mega Strike, o jogo entra numa espécie de minigame em que as bolas aparecem na tela e o jogador precisa usar o ponteiro do Wii Remote para movimentar a mão do Kritter e apertar o A para agarrar a bola.

A grande sacanagem aqui com relação à inteligência artificial é que enquanto o jogador tenta dar um Mega Strike, seu capitão está a deus-dará enquanto carrega, suscetível a carrinhos e pancadas do adversário. Seus colegas de time são inúteis. A CPU, por outro lado, enquanto ele começa a carregar um Mega Strike, é assistido pelos companheiros de time, que batem em nos seus jogadores antes deles chegarem perto do capitão oponente para enfiar uma voadora no maluco. E isso irrita, pois isso só é possível para o player humano quando tem dois jogadores em cooperativo contra a máquina, já que enquanto um carrega o Mega Strike, o outro pode ir controlando outros personagens contra aqueles que possam vir encher o saco.

Ah, também temos os itens, uma vez que jogo do Mario sem itens não é jogo do Mario. Aqui, os itens são recebidos no caso de eventuais faltas, que ocorrem quando alguém leva um empurrão ou carrinho sem estar com a bola. Também é possível receber itens quando um chute forte é desferido em relação ao gol.

Os times são montados com um capitão e três sidekicks. Os capitães são os personagens principais da turma do Mario, cada um com seu atributo: chute – que aqui diz respeito à força do chute; movimento, no caso, a velocidade do personagem; passe, que se refere à qualidade do passe, energizando a bola para que os chutes saiam mais fortes; e defesa, a força e distância da investida por empurrão ou pelo carrinho. Dependendo de como os atributos são distribuídos, os personagens adquirem classificações. Os balanceados têm valores iguais em todos os atributos (Mario, Luigi e Yoshi); os defensivos, com prioridade em defesa e movimento (Daisy e Waluigi); ofensivos, com maior valor em chute e passe (Wario, Bowser Jr.); os de força, que chutam forte e têm uma defesa alta (Donkey Kong, Bowser, Petey Piranha); e os armadores, que são rápidos e têm boa qualidade de passe (Peach, Diddy Kong).

Essas classificações também se aplicam aos Sidekicks, cada um com seu drible e seu skillshot, seu chute especial, capaz de causar problemas no goleiro. O meu favorito é o Hammer Bro., personagem ofensivo cujo drible é um martelo gigante que esmaga os adversários e cujo skillshot é arremessar uma série de martelos contra o goleiro Kritter, esmagando-o por alguns segundos e deixando o gol livre para estufar as redes. Na armação das jogadas, podemos escolher Toad, cujo drible é saltar por cima do adversário e tem um chute flamejante como skillshot; e Boo, que fica invisível e tem como skillshot a capacidade de possuir a bola para que ela passe pelo goleiro e entre no gol. Dry Bones é o único sidekick defensivo e tem a capacidade de se teletransportar alguns centímetros, dependendo da energia da bola. Seu skillshot envolve a bola em eletricidade, paralisando o goleiro. A bola costuma voltar especificamente para o próprio Dry Bones, que pode chutar no gol livre ou passar para alguém melhor posicionado. É parecido com o skillshot do Koopa Troopa, que envolve a bola num casco gigante e confunde o goleiro, mas a bola cai aleatoriamente no campo. Personagem balanceado, o Koopa Troopa consegue driblar o oponente ao deslizar alguns centímetros dentro de sua casca. Também balanceado é o Shy Guy, cujo drible é dar um pequeno salto para frente e cujo skillshot é montar num Bullet Bill, explodindo toda a área do goleiro e deixando todos caídos para que o chute possa ser desferido sem ninguém defendendo.

Há também os sidekicks de força, como a Birdo (ela prefere ser chamada no feminino, se é que me entende), cujo drible é um rodopio que afasta todos à volta e tem como skillshot um ovo gigante que atropela o goleiro direto para o gol; e o Monty Mole, que escava um buraco em direção ao gol em seu skillshot e se esconde na terra para driblar qualquer um que venha encher sua paciência.

O time é composto por quatro jogadores – cinco, se contarmos o Kritter, que é o goleiro de todos os times e não há outra opção – um capitão e três sidekicks. A ideia é balancear o time com jogadores de características diferentes para que as jogadas sejam montadas. Jogadores de armação com alta qualidade no passe podem trocar a bola, energizando-a. Quanto mais energia, mais o chute fica forte e é só passar para um jogador ofensivo ou de força, que vai mandá-la direto nas redes. O chute carregado do Donkey Kong ou do Petey Piranha marca gol de praticamente todo o canto da área adversária. Trocar a bola na defesa infinitamente e depois lançar para a área, resultando numa bica de primeira feita por um personagem com bom chute é uma estratégia comum praticada pelo jogo nas dificuldades mais avançadas.

E convenhamos, a graça do jogo está aí. É nisso que ele se destaca de qualquer título de futebol já feito antes. É por isso que Mario Strikers Charged me atrai tanto. É por isso que o modo dos Miis no FIFA 09 me interessa mais do que o modo normal. É muito mais legal jogar futebol com poderzinho. Por mais que o jogo “real” ainda seja viciante, o lance dos poderzinhos realmente destaca o título em si. Não são as tatuagens, que aumentam a verossimilhança com os jogadores reais. Não é o Oscar na capa que vai fazer o jogo vender mais (no caso do Brasil, é claro). É a porra do videogame tendo seu potencial explorado. E queria ressaltar que Mario Strikers já tem uns oito anos e naquela época tinha uma mecânica de goleiro anos-luz à frente do goleiro do último FIFA. É sério.

Além disso, mesmo rodando a 30fps (naquela época isso era o normal, por isso nem encrenco), o jogador consegue sentir o drama por trás da partida. Ele não fica puto, como é com FIFA. Quem joga simplesmente reclama rápido e vai tentar marcar mais gols para virar. FIFA deveria transmitir isso, mas não consegue.

E é claro que Mario Strikers Charged é muito mais carismático do que qualquer outro jogo de futebol existente. Não porque é Mario, mas porque a Next Level Games pegou os personagens de Mario e deram uma injeção de adrenalina em todos. Os capitães são muitas vezes quase irreconhecíveis por terem características aqui que não têm em lugar nenhum. Pô, nem a Peach, nem a Daisy são as princesinhas frágeis que estamos acostumados, imagem de mulher forte que o Smash deveria tentar passar para suas princesas e não consegue. A Daisy, inclusive, tem uma comemoração que é lamber o dedo e tocar com ele na bunda empinada enquanto faz “TSSSSSS”. Não sei nem como isso passou pela Nintendo. O Waluigi ganhou um chicote. Cara, eles conseguiram dar uma personalidade para alguém tão sem sal quanto o Waluigi. E apesar de quadradão e em baixa resolução, o visual não envelheceu muito. Ainda agrada bastante. O carisma dos personagens se deve também pelas músicas e comemorações. A música-tema do Koopa Troopa é um sample remixado de “Eu me remexo muito”, presente em Madagascar. O Luigi ganhou um Flamenco. São detalhes bacanas que tornam o jogo especial.

A Nintendo perdeu a oportunidade de aproveitar a combinação de fatores que envolvem a Copa de 2014, a falta de jogos no Wii U e a ausência da EA com suas franquias esportivas no aparelho para lançar uma nova versão de Mario Strikers. Poderia até fazer uso dos Amiibos, como desbloqueando novos sidekicks ou até capitães no jogo. Quem sabe o Amiibo do Link não poderia desbloquear uma arena em Hyrule? Que tal o próprio Link de uniforme pronto para bater uma bolinha com uns Skull Kids de Sidekicks?

Só que ela prefere botar a Next Level Games para produzir um Metroid Prime no 3DS que ninguém quer, né? Paciência.


Informações

  • Produção: Nintendo
  • Estúdio: Next Level Games
  • Ano: 2007
  • Gênero: Esporte
  • Plataformas: Nintendo Wii

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